segunda-feira, 27 de abril de 2009

Um lassi no inferno

Se uma dona-de-casa finlandesa alugar os DVDs de Cidade de Deus ou Tropa de Elite em uma locadora de Helsinque, será compreensível que ela descarte a ideia de passar férias no Brasil, horrorizada com a visão de um país onde crianças de oito anos correm descalças empunhando pistolas automáticas e montanhas de pneus queimam e assam pessoas no meio da rua.

Dentro desse mesmo espírito, quando vi o filme Quem Quer Ser Milionário, de Danny Boyle, tive a nítida convicção de que eu não visitaria a Índia nem por vinte milhões de rúpias, nem que o Malvino Salvador fosse meu acompanhante. A fita vencedora de sete Oscars mostra uma nação miserável, suja e nauseabunda, em que turistas são invariavelmente depenados, enquanto mercenários escravizam crianças pobres e arrancam-lhes os olhos, para em seguida explorá-los como cantores cegos.

Ao mesmo tempo em que admiro pessoas com cultura global, sempre interessadas e dispostas ao contato com outras realidades e civilizações, constatei que minha curiosidade em relação a culturas diferentes vai só até Tóquio e Istambul, e olhe lá. Em relação à Índia, eu bebo lassi, faço uma aulinha solta de ioga, como os PFs temáticos do Gopala, e namastê, meu bem. Meu amigo Tony que se aprofunde no resto - e nem precisa me convidar para os filmes de Bollywood que ele tanto adora (podem me chamar de cabeça-dura, que eu não ligo; todo mundo é mais curioso com alguns assuntos e menos com outros).

Feitas essas considerações, saí do cinema muito satisfeito. Não sei dizer se Slumdog Millionaire foi superestimado ou realmente vale todo o hype, só sei que foi o filme mais legal que vi no ano até agora. Depois da primeira meia hora, a história foi ganhando ritmo, criei empatia com o protagonista e fui gostando mais e mais, até achar que estava diante de um filmaço. Aos que ainda não viram, recomendo: vale até o choque de realidade e o desconfortável mergulho no mundo-cão.

[Nota mental: "esforçar-se para ver os filmes no mês em que eles entrarem em cartaz!"]

sexta-feira, 24 de abril de 2009

10 razões para você dar uma chance a BH

Antes de mais nada, quando falo em "dar uma chance", não é no sentido de fazer caridade, não. Belo Horizonte é uma graça de cidade. Mas menos gente vai conhecê-la do que poderia. Aqui vão alguns motivos para você se animar e experimentar.

1 ::: O acesso é relativamente fácil. Até dá para ir de carro: são 588km a partir de São Paulo e 444km do Rio. De ônibus, oito horas separam BH da capital paulista. Mas o melhor é aproveitar as ofertas das companhias aéreas - não é raro encontrar passagens na casa dos R$99. Fora das promoções, vá de OceanAir: as poltronas reclinam mais, o espaço entre as fileiras é maior e cada trecho sai em torno de R$150 a partir de Congonhas. Como o antigo aeroporto da Pampulha agora só recebe voos de dentro de Minas, você descerá em Confins, que fica nos confins do mundo. Mas ônibus executivos fazem o trajeto até o Centro por R$ 16,90, em intervalos de 30 minutos.

2 ::: BH é uma cidade agradável. Na grande área central demarcada pela Avenida do Contorno, as ruas, limpas e muito arborizadas, são mais convidativas para um passeio a pé do que as de São Paulo (apesar das ladeiras). O Parque Municipal é bonito e não merecia estar tão descuidado. Talvez tenha sido o feriado, mas também tive a sensação de que a capital mineira é calma e segura. Um amigo carioca me disse que BH é uma "metrópole com jeitão de interior", e agora consigo entender o que ele quis dizer.

3 ::: Se toda cidade pacata do interior tem uma praça, BH está muito bem servida nesse quesito. O planejamento urbano do Contorno desenhou várias delas. A que mais me encantou foi a Praça da Liberdade, com lindos jardins, coreto, duas fileiras de palmeiras imperiais e uma bucólica fonte luminosa. Outra que vale uma olhada rápida é a Praça do Papa, no caminho para Mangabeiras, que está em um plano elevado e tem uma vista OK da cidade (mas o melhor pôr-do-sol, você vê um pouco mais adiante, no Mirante das Mangabeiras).

4 ::: Para interessados em arquitetura, BH também tem uma porção de construções desenhadas por Oscar Niemeyer, incluindo até mesmo um "Copanzinho": o Edifício Niemeyer, na Praça da Liberdade. Nos anos 40, para desenvolver o entorno da Lagoa da Pampulha, Juscelino Kubitschek, então prefeito de BH, encomendou a Niemeyer vários edifícios, formando um conjunto arquitetônico: a Igreja São Francisco de Assis (que virou símbolo da cidade), a Casa do Baile (que tem jardins de Burle Marx e hoje sedia eventos de arquitetura e design) e o Museu de Arte da Pampulha, que nasceu como um cassino. Vá no fim de semana e aproveite para conferir as beldades fazendo cooper na Lagoa.

5 ::: Enquanto São Paulo tem os Jardins e o Rio tem Ipanema, em BH a zona charmosa é formada pelos bairros de Lourdes (que lembra o Moinhos de Vento em Porto Alegre) e Funcionários (onde fica a região conhecida como Savassi). Não espere uma Oscar Freire que concentre todo o movimento: os lugares legais estão dispersos, espalhados pelas ruas da região. Algumas dicas são o Graciliano (Rua Marília de Dirceu, 40), mistura de restaurante e delicatessen que faz festas eletrônicas quinzenais às sextas, o Yo Sushi (Rua Inconfidentes, 302), restaurante japonês fervidinho, e o California Coffee (Rua Sergipe, 1199), bom para fazer aquela pausa e tomar um Black Forest (espécie de shake de café gelado com gostinho de floresta negra).

6 ::: A comida é ótima e custa menos do que no eixo Rio-SP. O melhor almoço da viagem (e que ganhei de aniversário) foi no Café do Museu, que serve pratos contemporâneos divinos em um belo espaço, no mezanino do Museu Abílio Barreto. Para se esbaldar na culinária típica, todos dizem que o must de BH é o Xapuri: em um ambiente que recria uma casa de fazenda, pratos tradicionais mineiros são preparados no fogo à lenha (vá cedo, a espera pode ser inviável). Na linha gordelícias, tem os incríveis milk shakes de amendoim e de nutella do Eddie Fine Burgers, os croissants de amêndoas da Casa Bonomi e os doces da Ah Bon. E, se a larica bater de madrugada, aposte nas massas 24hs do La Greppia ou nos pratos de estivador do tradicional Bolão, em Santa Tereza.

7 ::: Você gosta de bebericar, petiscar e jogar conversa fora? Então saiba que BH é a capital dos bares e botecos, com lugares de todos os tipos, cores e tamanhos. A tradição é reforçada pelo festival Comida di Buteco, espécie de concurso anual em que 41 botecos criam receitas que reinterpretam a culinária de raiz (a edição 2009 já está rolando e vai até 17/5). Meu endereço preferido é o Café com Letras (Rua Antônio de Albuquerque, 781), um bar-livraria construído numa casinha antiga absolutamente fofa e encantadora. Frequência bonita, música cool, pratos saborosos, uma torta de limão incrível e o melhor cosmopolitan que já provei. É só abstrair o serviço, um tanto apalermado, para não dizer pateta.

8 ::: A Josefine - ou Jô, para os nativos - é um dos melhores clubes gays em que já estive, tendo como parâmetro a noite de outras capitais do mesmo porte de BH. No térreo, a pista principal recebe uma mistura bem animada de pólo boys novinhos, barbies descamisadas e meninas fervidas, que dançam ao som do residente Mauro Mozart, um cafuçu altamente umidificante (ovulei horrorezzz com a cara de mau dele!). No piso superior, há outra pista, com um lindo jogo de lustres azuis e vermelhos, em que o som é electro. Como alternativas à Jô, há o Andaluz Club Café, também gay, e alguns clubinhos mixed, como o Miss Pig e o Mary In Hell. Isso se não tiver alguma festa especial rolando por aí.

9 ::: Cansou da capital? Existem várias atrações bacanas nas imediações. Todo mundo lembra primeiro das cidades históricas: a superpop Ouro Preto, com suas ladeiras, igrejas e restaurantes, fica a apenas uma hora de carro. Se preferir algo menos muvucado e mais intimista, tente Tiradentes, a 210km de BH. No capítulo ecoturismo, o Parque Nacional da Serra do Cipó tem esportes radicais e uma porção de cachoeiras. Por fim, o Inhotim (em Brumadinho, a 60km de BH) é uma espécie de centro de arte contemporânea, formado por sete pavilhões espalhados dentro de um belo parque ambiental. Quem conhece diz que é incrível (tive que deixar esse passeio para a próxima visita, que não deve demorar).

10 ::: Last but not least, a maior surpresa da viagem: os mineiros! Nunca vi um povo tão acessível, simpático, carinhoso. É muito fácil puxar papo com gente nova e você logo se sente inserido. Conhecê-los e jogar conversa fora com eles é um prazer, dá para ficar horas ali (vai ver que é por isso que existem tantos bares). Sem falar que eles recebem muito bem: em minha estada de quatro dias, não passei cinco minutos sozinho. Os baianos que se cuidem, porque os mineiros são sérios candidatos ao título de povo mais boa-praça do Brasil.

[FOTOS: Praça da Liberdade; pôr-do-sol no Mirante das Mangabeiras]

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Trabalhador vítima de preconceito conquista direito a uma indenização milionária

Ao entrar em uma agência do Bradesco na Av. Antônio Carlos Magalhães, uma das principais da cidade de Salvador, o gerente Antônio Ferreira dos Santos, que completava 20 anos de carreira no banco em 2004, foi surpreendido por uma carta: "O senhor está demitido por justa causa por motivo de desídia, indisciplina e ato de improbidade". Indignado, recorreu à Justiça, o que resultou na maior indenização trabalhista envolvendo uma vítima de assédio moral já concedida pela Justiça brasileira, e na primeira condenação do Tribunal Superior do Trabalho (TST) por uma demissão imotivada envolvendo preconceito por conta da orientação sexual do trabalhador.

Os ministros da segunda turma do Tribunal garantiram a Santos uma indenização de R$ 1,3 milhão. Até então, a maior indenização por assédio moral de que se tinha notícia no país havia sido de R$ 1 milhão, contra a Ambev, mas em uma ação civil pública em benefício de vários trabalhadores, e que foi resolvida por acordo nas instâncias inferiores, sem chegar ao TST.

Na Justiça do Trabalho, o assédio moral é caracterizado por atos repetidos de violência moral e tortura psíquica e pela intenção de degradar as condições de trabalho do empregado. Os motivos vão desde a pressão pelo cumprimento de metas, especialmente na área de vendas, até humilhações constantes pela opção política do empregado ou por ser portador do vírus HIV, por exemplo. Geralmente, os valores das indenizações em processos individuais variam entre R$ 10 mil e R$ 30 mil, majorados conforme o tempo do contrato de trabalho em questão.

No caso julgado agora pelo TST, o gerente do banco começou sua carreira no Baneb, incorporado em 1999 pelo Bradesco, e estava na instituição há 20 anos. Segundo ele, o assédio moral ocorreu durante os últimos cinco anos de trabalho na agência, até 2004, ano em que a ação foi ajuizada. "Foram os piores anos da minha vida", diz Santos. O gerente relatou à 24ª Vara do Trabalho de Salvador diversos episódios de preconceito sofridos por conta da atitude de um diretor regional do Bradesco que, segundo ele, frequentemente o expunha a constrangimentos públicos - por exemplo, sugerindo que ele utilizasse o banheiro feminino da agência ou dizendo, em público, que o banco "não era lugar de viado".

Após ouvir três testemunhas, a primeira instância considerou que foi colocado em prática um ato típico da Inquisição, que a história já conhece e abomina, e que a empresa deveria arcar com as consequências. Caracterizado o assédio, foi fixada uma indenização de R$ 916 mil, por danos morais (pela humilhação) e materiais (porque, ao ter sido dispensado por justa causa por improbidade administrativa, o trabalhador teve dificuldade de conseguir novo emprego). "A justa causa foi uma forma de camuflar o preconceito", diz o advogado Bruno Galiano, do escritório Cedraz & Tourinho Dantas, que defende o trabalhador.

O Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região (Bahia) concluiu que a demissão foi discriminatória, mas reduziu o valor da indenização para R$ 200 mil. A disputa chegou ao TST em 2006, cabendo aos ministros decidir se a Lei nº 9.029/95, que quantifica o valor das indenizações em razão de demissões arbitrárias, poderia ser utilizada no caso. Essa lei prevê indenização no caso de preconceito por "sexo" e até então só havia sido usada em casos de discriminação de mulheres no trabalho. Para o ministro Renato de Lacerda Paiva, a lei não surgiu para limitar os motivos da discriminação: outros motivos, como o preconceito por antecedentes criminais, falta de boa aparência e opção política não estão nas normas, e não deixam de ser discriminação.

Os ministros consideraram ainda determinações das convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e princípios constitucionais de igualdade e dignidade. A possibilidade de uso da Lei nº 9.029 aumentou a indenização. Isso porque a norma oferece duas opções ao trabalhador demitido por discriminação: a reintegração no cargo ou a condenação da empresa ao pagamento do dobro de seu salário desde o ajuizamento da ação até o trânsito em julgado da sentença, com correção monetária. No caso de Santos, que recebia em torno de R$ 5 mil, a quantia total da indenização por danos somada à condenação pela Lei nº 9.029 já alcança R$ 1,3 milhão. Ainda cabem recursos ao próprio TST e ao Supremo Tribunal Federal (STF). Assim, se o banco recorrer e perder, o retardamento do processo pode levar a uma indenização ainda maior.

[Matéria publicada hoje no Valor Econômico; a autora é Luiza de Carvalho. Postei aqui porque acho que essas vitórias merecem ser comemoradas e divulgadas!]

terça-feira, 21 de abril de 2009

Obrigado por tudo!

Hoje estou completando 31 primaveras. Desta vez, não estou vivendo o mesmo turbilhão de emoções do ano passado, e sim passando a data de um jeito mais leve e zen. Sem expectativas excessivas, mas totalmente seguro de que o melhor está no meu caminho. Tenho tido muitas bênçãos: saúde perfeita, a melhor mãe do mundo, amigos absolutamente maravilhosos, desafios e oportunidades para que eu possa crescer e alcançar as coisas que quero e sempre quis. E vem muito mais por aí.

Escrevo estas linhas em Belo Horizonte, longe dos amigos de sempre, mas cercado por outros: pessoas bacanérrimas, encantadoras, supercarinhosas, que têm feito jus à fama dos mineiros de serem um povo simpático, boa-praça e acolhedor. Deixo aqui meu carinho e gratidão aos meus queridos anfitriões, Marco, João e Johnny, além de Marcelo e Ric, Rodrigo, Leo, Gil, Paulinha, Henrique e Bruno, pessoas que são por si só uma boa razão para eu voltar a BH (as outras razões, vocês saberão no próximo post, em breve!)

Também quero agradecer a todos vocês, que ajudaram estes "Textos, Pretextos e Contextos de Introspective" a ultrapassar a marca das 150 mil visitas. Amigos queridos e fiéis e também pessoas novas que, vira e mexe, me abordam nos lugares, dizendo "ei! eu adoro o seu blog!" e me deixam muito feliz e motivado a continuar escrevendo. Se depender de mim, vocês ainda poderão ler muitos textos meus aqui e em vários outros lugares! Beijo grande a todos e nos vemos por aí!

[FOTO: tarde de sol na Praça da Liberdade, Bairro Funcionários, BH]

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Doritos, boás e purpurina

O Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária (Conar) determinou ontem a suspensão da veiculação daquele malfadado comercial do salgadinho Doritos, em que um adolescente era gongado por fazer a dancinha de "YMCA". A propaganda foi considerada ofensiva aos homossexuais, na avaliação dos conselheiros de ética da entidade, que votaram, em sua maioria, pelo pedido de sustação do filme. Na época do bafafá, a fabricante PepsiCo afirmou que a peça "não faz nenhuma menção ao homossexualismo" e "respeito, compartilhamento e inclusão são valores indispensáveis para a empresa", em uma nota que não poderia ter sido mais chapa-branca. Agora, ao invés de deixar a poeira baixar sobre o episódio, a empresa irá recorrer da decisão.

Não vou entrar no mérito da propaganda (o que, a esta altura do campeonato, seria como chutar cachorro morto). O que chamou a minha atenção foi que, enquanto os gays se indignaram, os héteros não conseguiram enxergar preconceito algum na peça publicitária. Nos sites AdNews e Clube Online, dirigidos a publicitários, a notícia da suspensão do comercial foi recebida com reprovação. "Ridículo! está acontecendo uma verdadeiro exagero, questiono a capacidade dos profissionais deste conselho em avaliar as queixas", "preconceituoso é quem enxerga a polêmica, a propaganda é ótima", "as reclamações vieram de pessoas que não têm um mínimo de senso de humor, esse é o único comercial que eu paro pra assistir", "obviamente é uma brincadeira sem maldade".

De fato, a grande massa heterossexual não vê nenhuma maldade em se fazer piada com os gays. É uma questão de mentalidade. Ridicularizar os negros é moralmente reprovável, com o racismo sendo alçado ao status de crime (até mesmo hediondo, para alguns), mas os homossexuais não merecem o mesmo veredito quando a violência é dirigida a eles. A referência projetada socialmente - gays são pessoas caricatas, inofensivas, brincalhonas, que não se deve levar a sério - reforça a idéia de que achincalhá-los é normal e plenamente aceitável. A participação de Silvetty Montilla no último Toma Lá Dá Cá, na Rede Globo não me deixa mentir. Que mal há em rir das bichas? É tudo brincadeira! Não me surpreende que o jornal carioca Meia Hora tenha noticiado a morte do estilista Clodovil com a manchete "virou purpurina". Afinal, somos todos alegres e divertidos, não é mesmo? Como gostam de escrever os héteros, "kkkk".

SoGo: mudou sem deixar de ser a mesma

Eu li em uma revista especializada que, na indústria automobilística brasileira, um carro é projetado para viver 8 ou 10 anos, antes de sair de linha. No entanto, não dá para o produto ficar intocado por tanto tempo: se, ao longo dos anos, ele não passar por algumas reformulações, o comprador, sempre ávido por novidades, perderá o interesse nele e migrará para a concorrência. Para postergar a vida útil de um carro no mercado por mais alguns anos, até que seu substituto esteja pronto, as montadoras recorrem ao chamado facelift: fazem mudanças estéticas sutis - nos faróis ou no desenho da grade dianteira, por exemplo - que rejuvenescem e dão um novo sopro de vida ao veículo, mantendo seu apelo junto ao consumidor.

Pois bem, o clube SoGo acaba de ganhar seu facelift, revelado ao público anteontem, em uma festa semifechada. Já não era sem tempo: a casa completou dez anos de estrada, o que não é pouco. Especialmente se lembrarmos que ela está instalada no coração dos Jardins, que tem um histórico de intolerância a estabelecimentos gays por parte da vizinhança. A cruzada homofóbica do bairro atirava garrafas em freqüentadores do bar L'Open e conseguiu varrer do mapa o Ultralounge. Diz a lenda que a SoGo não teve o mesmo destino porque seu imóvel era próprio e não alugado; quando os vizinhos insistiram em pedir o fechamento, o proprietário da SoGo disse que então usaria a casa para servir sopa a travestis soropositivas. Os vizinhos, então, teriam preferido deixar o clube em paz...

Se a idéia era dar um chica-chica-bum no ambiente, parece que a intervenção cirúrgica funcionou. O bar ganhou tons mais claros e ficou mais moderno e convidativo. Aquela porta giratória horrenda que ficava no meio do caminho e parecia ter saído de uma boate da rua Franz Schubert, direto dos anos 90, foi retirada, o que fez a casa ganhar um bom espaço. A pista ganhou uns filetes laterais de luz bem bacaninhas e o DJ agora toca num balcão mais baixo, que permite interação com o público. Subindo as escadas, o tricô nos banheiros continua bafônico, e é por eles que será feito o acesso ao dungeon bar, o anexo "picante" da casa, cuja repaginação ainda não está concluída.

É claro que, com bebida a rodo (ao contrário do que prometia o convite, o open bar não foi só até meia-noite) e aquele clima eufórico de inauguração, cheio de gente conhecida, a noite não tinha como ser ruim. Mas dá para ver que o clube acertou mesmo. Por um lado, a reforma deu uma atualizada no espaço, espantou o "bode" de quem já havia se cansado (eu mesmo não pisava lá havia pelo menos seis anos) e reinseriu a casa no circuito. Por outro, o lugar não se descaracterizou e continua tendo o mesmo clima aconchegante de que as pessoas aprenderam a gostar. Se tratarem a programação musical com algum capricho (consta que as quintas terão uma pegada mais eletrônica, com Mimi e Marcelo Saturnino), a SoGo pode ser uma ótima opção para o meio da semana e até para o finde. Afinal, é legal alucinar em um espaço mega, mas precisamos de bons clubes menores também.

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Consagração ou compaixão?


Britains Got Talent 2009 Susan Boyle 47 Year Old Singer
Enviado por kj1983

Quando postei aquele vídeo adorável dos meninos fazendo a dancinha do Daft Punk, um leitor anônimo resmungou que tratava-se de "notícia velha, vídeo antigo". Então, desta vez vou me redimir postando sem demora o vídeo-coqueluche da semana: o de Susan Boyle, uma aspirante a cantora que causou sensação no programa Britain's Got Talent, espécie de American Idol inglês.

Não tenho estofo para comentar a performance de Susan, mas é evidente que a comoção gerada tem pouco a ver com os dotes vocais da jovem senhora. O buraco é mais embaixo: a candidata foi inicialmente recebida pelos jurados e pelo público com má vontade e risinhos jocosos, pelo simples fato de que não se enquadra nos padrões de beleza vigentes (Susan parece encarnar aquele típico "loser da vida real", que as comédias inglesas exploram à exaustão). Mas, quando ela começou a cantar, eis que o marreco virou cisne: todos os presentes se emocionaram, visivelmente pegos de surpresa. Não pareciam dispostos a dar uma chance a ela, porque era feia, malvestida e desengonçada, mas acabaram deixando os julgamentos de lado e ovacionando o número, que ganhou nota máxima dos jurados, num final edificante, que deve ter dado orgasmos à produção do programa.

O vídeo está tendo uma mega repercussão: enquanto digito este post, foram mais de 12 milhões de acessos no YouTube (até meu chefe, que costuma ser o trigésimo oitavo elo na cadeia de transmissão de hypes, já assistiu). A maioria dos comentários é de pessoas que se mostram encantadas com a vitória de anti-herói protagonizada por Susan: no blog do Tony, por exemplo, o leitor André Luís Aquino fez um desabafo longo e emocionado. Mas há quem enxergue a coisa com senso crítico. Afinal, Susan deveria ter sido tratada como uma candidata qualquer e valorizada por seu talento - não com misericórdia e compaixão, que não deixam de ser formas de preconceito às avessas contra quem está fora dos padrões. É o que defende Rubens neste post, e neste outro também, fazendo um contraponto bastante interessante. [UPDATE: também recomendo que não deixem de ler este fantástico post, de longe o melhor sobre o "caso Susan"].

quarta-feira, 15 de abril de 2009

GPS para GLS

São Paulo pode ter atrações para todas as tribos, mas é uma cidade que não sabe tratar os seus turistas. Os postos de informações são difíceis de encontrar e o material de apoio é escasso. Numa metrópole de porte gigantesco, transporte público nada intuitivo e transeuntes nem sempre dispostos a parar e ajudar o próximo, o mínimo que se pode oferecer para que um visitante consiga se virar é um mapa de bolso decente, que cubra as áreas mais interessantes para o turista. Praticamente toda grande capital que se preza tem isso. E muitas (inclusive Buenos Aires) ainda têm mapas dirigidos ao público gay, apontando onde ficam os bares, as boates e as saunas.

O que muitos talvez não saibam é que já existe um produto desse tipo por aqui. O São Paulo de Bolso acaba de completar um ano, com quatro edições de distribuição dirigida: em pontos estratégicos como as lojas Foch, a sauna 269, o restaurante Consulado Mineiro e a rede de hotéis Formule 1. Eu já devo ter visto alguma das edições passadas, mas confesso que só parei para examinar o dito cujo no feriado de Páscoa, quando amigos de fora vieram me visitar e eu peguei na fofíssima loja 2Meninos alguns mapinhas para dar a eles.

O material, em dimensões bastante convenientes (11cm x 11cm), compreende um mapa dobrável e um livrinho, do qual pode ser destacado. Recheado de anúncios, o mapa faz um recorte bastante completo do miolo que importa para o turista: a região da Paulista e Jardins, o Centro, a boemia de Pinheiros, Vila Madalena e Itaim e bairros residenciais como Higienópolis, Perdizes, Vila Mariana, Moema e até uma parte do Morumbi. É reconfortante a sensação de que a cidade cabe na palma da mão e pode ser assimilada. Os estabelecimentos de interesse GLS estão marcados com bolinhas numeradas.

O livrinho dá suporte ao mapa, com os estabelecimentos listados na ordem das bolinhas numeradas. Se serve como simples legenda, começa a derrapar quando arrisca ir além. Saltam aos olhos erros de português ("acadêmias", "alta estima" onde claramente queria se dizer autoestima, "bambú terapia") e traduções toscas para o inglês ("stores suplements", "coffees"). As descrições dos lugares são pobres, redundantes ("saboreie doces momentos com melhor doce", "cozinha tailandesa numa cozinha contemporânea") e nada informativas. O Kayomix, por exemplo, é um "restaurante japonês que dispensa qualquer tipo de apresentação" (ah, bom! muito esclarecedor: o leitor que não conhece é burro e desinformado). O Exquisito é - adivinhem! - um "bar totalmente exquisito, que faz jus ao nome". O Piaf é um lugar "de bem com a vida" (oi?). O shopping Pátio Higienópolis é de "alto poder aquisitivo" (não seriam os clientes?). O Conjunto Nacional é "o point cultural clássico da cidade" (desde quando?). E as "underwears" [sic] da Foch "estão presentes em 70% dos gays" (por acaso a mocinha do IBGE já parou algum de vocês na The Week?)

Se as indicações do guia já trazem um festival de bobagens, a coisa complica ainda mais quando o guia tenta oferecer conteúdo jornalístico. A entrevista com a personalidade da capa, um empresário mineiro que veio abrir uma associação LGBT em São Paulo, é sofrível: não soube tirar boas respostas de alguém que certamente tinha algo a dizer, nem mesmo mostra a que veio a tal associação. Mas o pior de tudo é a "matéria de saúde", um texto (muito mal) escrito pelo diretor de um centro de tratamento para dependentes químicos, que só faz desfiar um rosário de clichês, em tom de julgamento e recriminação. Os usuários "possuem uma fragilidade de virtudes", "é quase impossível encontrar valores refinados (?) como bondade, compaixão e amor" e, para terminar, "em muitos casos podemos somente assistir seu fim de maneira deplorada" [sic]. Pastor evangélico perde.

Enfim, a iniciativa do SPdB era mais do que necessária e deve ser prestigiada. Com uma parada gay levando 3 milhões de almas à Avenida Paulista e uma cena que tenta se articular e se profissionalizar, já estava na hora de alguém pensar em algo tão básico como um guia de bolso para os turistas que vêm se jogar por aqui. Mas o produto ainda tem muita coisa a melhorar, a começar pelos textos, que precisam urgentemente de uma supervisão competente. Por enquanto, o guia vale mais pelo mapa em si - que fica ainda mais portátil se, após jogar o livrinho fora, você rasgar cuidadosamente os anúncios em volta. Mas algo me diz que não era essa a idéia original deles...

sábado, 11 de abril de 2009

Oi e boa Páscoa!

São Paulo está com uns dias lindos, lindos. Céu azul, sol e um calor que não incomoda e diminui bastante no fim da tarde. E tudo fica ainda mais gostoso por ser feriado: com a debandada em massa dos paulistanos, as ruas estão tranquilas e não há filas para nada. É uma boa ocasião para ir almoçar em algum dos lugares que sugeri no post de 6 de fevereiro, um roteiro só de restaurantes em espaços agradáveis, com muita luz natural ou mesas ao ar livre.

Enquanto a maioria descansa, eu rebolo para dar conta de pendências no escritório, provas e trabalhos no curso de jornalismo. A coisa tá preta aqui. Vou tentar não deixar a peteca cair, mas é possível que o ritmo das postagens no blog diminua nos próximos dias. Mas assuntos nunca faltam. E, no final de semana que vem (outro feriado, Tiradentes e meu aniversário), vou me jogar em Belo Horizonte. Mais uma vez, passo o chapéu e peço dicas de passeios, comidinhas e fervos aos meus leitores amigos. Boa Páscoa para todos!

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Daft Punk no Créu 5



Enquanto a febre da Stephany continua se alastrando por aqui, internautas de outras partes do mundo também cultuam suas pragas virais. Vejam só que bonitinha esta. Dois rapazes franceses fazem um stripzinho e dançam "Harder, Better, Faster, Stronger", do Daft Punk. Para acompanhar a música, eles vão mostrando as palavras da letra pintadas em diversas partes de seus corpos. Parece bobo? Pois então tente fazer em casa - não deve ser fácil sincronizar tanta informação, especialmente quando os versos vão ficando mais rápidos...

A ideia só não é mais genial porque o vídeo deles é, na verdade, uma resposta a uma versão anterior da brincadeira, feita por duas meninas branquelas e bundudas, com caixas de papelão na cabeça (e, portanto, bem menos interessante). Ambos os vídeos andam bombando no YouTube: a versão male teve mais de 2,5 milhões de acessos e a original, 5,7 milhões de exibições.

domingo, 5 de abril de 2009

A fórmula do Skol Terreirón


Sabem como se faz a "melhor festa eletrônica do mundo"?

Prestem atenção na fórmula, macacas:

Pacha + Beto Carreiro World + Salão do Automóvel = SKOL SENSATION

(Foi o erro! Filas gigantescas para entrar, música simplesmente horrorooosa, shows que eram o cúmulo da cafonice, produção bem mais pobre que a original, bares em colapso, héteros mal-educados e, para coroar o desastre, seguranças que empurravam, agrediam e machucavam o público, na tentativa de abrir espaço rápido na pista, para que um carrinho cheio de performers-medo desfilasse.
Tipo, fomos literalmente ATROPELADOS pela "intervenção artística",
é mole???)

Eita dinheiro jogado fora! Jesus me dê Fendi!

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Rapidíssimas

EMPÓRIO ::: Amanhã e domingo vai ter Mercado Mundo Mix, em novo endereço: um estacionamento na Av. Paulista, perto do prédio da Gazeta. Quando comecei a sair, nos idos de 1998-1999, eu adorava ir ao MMM e também ao Mambo Bazar (que rolava naquele casarão lindo em frente ao Bob's). Depois, acho que tudo se pasteurizou demais e perdeu a essência. Mas vou dar uma conferida, nem que seja por nostalgia!

DORIL ::: Os usuários do Manhunt estão bem desgostosos. A reformulação visual do site, feita às pressas e de qualquer jeito, simplesmente deletou as mensagens da caixa de entrada e o histórico de visitantes dos usuários. Pra piorar, muitos não conseguem fazer login e recebem a informação de que tiveram o perfil desativado. Melhor se tivesse ficado como estava, não?

BACALHOADA ::: São Paulo sempre teve opções para os amantes do sexo por atacado: Gladiators, Blackout, RG31 e as festas da sauna Wild são alguns exemplos. Tinham lá seus adeptos, mas o grande público torcia o nariz. A popularidade da 269, com seu grande estábulo no piso superior, provocou uma mudança de atitude: o povo foi perdendo o pudor de se jogar na frente de todo mundo. Hoje, outro sex club abre as portas: o Upgrade, tocado por um ex-sócio do RG31. Será que agora a coisa pega?

PASSAPORTE ::: E a The Week finalmente começa a dar seus primeiros passos no exterior. Alguns especulavam sobre uma possível filial em Buenos Aires, mas, por enquanto, o clube fala apenas em festas. A primeira será na DBOY de Barcelona, no dia 11/4, aproveitando o fluxo de europeus que vão passar a Páscoa na capital catalã. Depois, virão França, Inglaterra, Canadá, Argentina e México. Gostei da DBOY, mas acho que será ainda mais legal quando a TW fizer day parties em lugares abertos!

DORMINHOCO ::: Confesso que não esperava que a procura pelo Skol Sensation fosse tão grande. Resultado: demorei para comprar meu convite, a meia entrada acabou e agora eu simplesmente não quero pagar R$160. Depois eu pergunto pros amigos como foi. Next...

quarta-feira, 1 de abril de 2009

A "aerovana" da Gol ataca Buenos Aires

Enquanto eu dava pinta no Planalto Central, teve muita gente que passou o fim de semana se esfalfando para tentar comprar os assentos promocionais que a Gol disponibilizou no tal Feirão. Como já aconteceu em promoções semelhantes dessa companhia que nasceu para ser barata, o site teve vários problemas - e, ainda assim, o resultado das vendas foi 40% superior ao que eles esperavam. Entre as pechinchas, tinha Guarulhos-Buenos Aires a R$179.

Alguns amigos felizardos conseguiram garfar seus lugares e vieram me pedir dicas argentinas. O blog tem bastante coisa sobre o assunto, que ainda é um dos que mais atraem internautas para cá, por meio dos sites de busca. Basta clicar no marcador "buenos aires", no canto esquerdo, e todos os meus posts relacionados ao tema aparecerão. Vou aproveitar essa "marolinha" de interesse sobre a cidade e deixar aqui mais algumas dicas.

Pelo visto, o Palacio Alsina deixou de fazer noites gays [alguém pode confirmar essa informação?]. Com isso, o Amerika torna-se praticamente a única opção de clube direcionado às culegas di classe. Pelo menos, o clube tem caprichado na programação eletrônica: amanhã, por exemplo, o convidado é o sempre chique Aldo Haydar. No capítulo bares, um amigo portenho acabou de me contar sobre uma nova opção para as sextas, o Rheo Bar, que fica ao lado do Crobar (ali no Paseo de La Infanta, dentro dos Bosques de Palermo). Ele disse também que o clube eletrônico Mandarine está emplacando nos sábados como uma opção um pouco mais gay do que o Pacha.

Neste sábado, nunca é demais lembrar que vai rolar em Costa Salguero a edição 2009 do festival Southfest - com Sasha, Tiga, Fischerspooner e o ótimo Basement Jaxx no line up. Nem preciso dizer que, por conta do festival, o after do Caix (que também fica em Costa Salguero) estará babadeiríssimo e absolutamente imperdível. Se bobear, vai ser mais divertido que o Southfest em si.

Para quem gosta de gastronomia e já é habitué da cidade, uma dica bem legal é o Guía Oleo, um site com resenhas de restaurantes. Jabá não entra: as avaliações são feitas pelo próprio público, que dá notas sobre comida, serviço e ambiente, e faz comentários francos e reveladores. É uma ótima maneira de se inteirar sobre as novidades do circuito (há uma seção só com lugares novos) e também saber a quantas andam os velhos conhecidos. Antigos favoritos do blog, o bufê Marini Gourmet e o tailandês Empire parecem ter deixado a peteca cair, tamanho o número de críticas falando sobre sua decadência. Outro que não tem sido poupado é o Te Mataré Ramirez, aquele da culinária contemporânea afrodisíaca. Hora de riscá-los do roteiro e abrir espaço para outros sabores.

Já para quem quer se situar na noite portenha, o endereço é o Buenos Aliens, que traz a agenda dos principais clubes/festas/afters da cidade e arredores. Ótimo para achar baladas no meio da semana (o Bahrein continua bombando), ou mesmo descobrir quem estará tocando no seu boliche (clube) predileto no finde. Hoje, rola no Niceto uma edição da Brandon Gay Day, festa esporádica que atrai um público gay mais alternativo. E para quem gosta de um som eletrônico mais underground, aqui vai a última dica: dizem que o Cocoliche está cada vez melhor.

[UPDATE: para pesquisar restaurantes, mais uma dica é o site Vidal Buzzi, que tem um mecanismo completo de busca por ambiente, comida, bairro e faixa de preço]